Milho, uma nova história de sucesso no agronegócio brasileiro
25/06/2019
Amélio Dall’Agnol e Walter Fernandes Meirelles, pesquisadores da Embrapa
Na agricultura brasileira, soja e milho juntos compõem um dos maiores sistemas de produção da agricultura tropical no mundo, com a soja cultivada na primavera/verão e o milho no outono/inverno (segunda safra ou “safrinha”), duas safras/ano sem irrigação. O milho safra, cuja área cultivada era de cerca de 13 milhões de hectares (Mha) na média da década de 1980, na safra atual (2018/19) caiu para 5.0 Mha, ao tempo que, no mesmo período, o milho safrinha passou de 360 mil hectares para os atuais 13 Mha. Da mesma forma, a produção do milho safra oscilou de 22 milhões de toneladas (Mt), na média dos anos 80, para as atuais 26 Mt e o milho safrinha evoluiu de 0,4 Mt para 75,7 Mt.
A rotação propriamente dita, com soja cedendo espaço para o milho em um certo percentual de área no verão, é realidade na região sul do país, com excelentes resultados para ambas as culturas. Além disso, muitos aprimoramentos têm sido alcançados pela diversificação do sistema de produção, através do consórcio do milho com espécies de cobertura, em especial a braquiária, podendo-se inserir, ainda, espécies arbóreas, e até animais, que também trazem contribuições de diversas naturezas. Tais tecnologias têm resultado em ganhos significativos do ponto de vista ambiental, que resultam em ganhos econômicos à medida que o solo é protegido e melhorado em sua estrutura.
Milho e soja formam a dupla que produz a carne de frango, de porco, de peixe, do boi confinado. Cerca de 70% do milho produzido no país vira ração, agregando valor à cadeia produtiva do grão, além do que é produzido para silagem, para indústria da alimentação humana, do milho in natura usado como milho verde na produção de pamonha e de outros usos especiais (milho pipoca, milho doce, minimilho, milho biofortificado e milho QPM – com teores mais elevados de lisina e triptofano, aminoácidos essenciais.
No Brasil, o milho liderou a área cultivada com lavouras anuais até 1998, quando a soja ocupou a primeira posição. Atualmente, a área cultivada com soja é o dobro da do milho: 36 Mha para a soja, ante 18 Mha para o milho. Dada a diferença de áreas utilizadas com ambas as culturas, parece pouco provável que a área plantada com o cereal venha novamente superar a área da oleaginosa, no curto e médio prazos.
Entre 1990 e 2018, a produtividade do milho aumentou em 198% no Brasil (1.881 kg/ha em 1990 vs 5.600 kg/ha em 2018), enquanto o aumento de produtividade na soja foi de 90% (1.740 kg/ha em 1990 vs 3.300 kg/ha em 2018). No entanto, a produtividade média do milho brasileiro é ainda muito baixa quando comparada com a norte-americana, que foi de 10.610 kg/ha em 2018. Mesmo assim melhorou muito, se considerarmos que a produtividade média do cereal no Brasil nos anos 90 não passava dos 3.000 kg/ha; quase dobrou de tamanho desde então.
Para a safra 2018/19, a expectativa brasileira é de uma produção de milho superior a 101 Mt, ante apenas 52 Mt em 2007/08; um salto de 94% em apenas uma década. Com o expressivo aumento da produção, o Brasil passou a ser, também, grande exportador do cereal, assumindo recentemente a vice liderança global, depois dos EUA. A expectativa dos analistas de mercado é que o Brasil se fixará como 2º exportador mundial de milho, comercializando cerca de 30 Mt anuais no mercado externo. Para a safra 2019/20, o USDA estima as exportações norte-americanas de milho em 55 Mt; 3,0 Mt a menos do que exportaram em 2018/19, dada a expectativa de queda na produção, pelo histórico atraso na semeadura do cereal naquele país. A Argentina também entrou no páreo e, segundo o USDA, exportará 33,5 Mt, consolidando-se como 3º exportador global.
Na última temporada (2017/18), as exportações brasileiras de milho somaram 25 Mt, mas já chegaram a 36 Mt na temporada 2015/16, e sinalizam com a possibilidade de exportar 35 Mt em 2019 (USDA), consequência da excelente safra atual, da melhoria nas cotações do mercado face ao conflito sino-americano, do atraso no plantio pelo excesso de chuvas no cinturão agrícola dos EUA e da desvalorização do real frente ao dólar. Por causa do excesso de chuvas, cerca de 3.0 Mha previstos para a cultura do milho deixarão de ser cultivados nos EUA. Na área semeada, estima-se redução de 6% na produtividade – queda superior a 20 Mt, nos 34,2 Mha cultivados.
As datas para plantio e requisição de seguro estão encerradas e o relatório do USDA mostra o milho com apenas 67% da área plantada no final de maio, contra 96% na média dos cinco anos anteriores. Este fato fez o preço do cereal disparar na Bolsa de Chicago, encarecendo o produto americano, o que levou alguns importadores a buscarem milho mais barato em outros mercados, como Brasil e Argentina.
Poucos países, se é que existe algum, não cultivam o milho para alimentação humana e/ou animal, o que faz dele uma das culturas mais importantes do planeta. É o único cereal nativo das Américas, tendo o México como seu centro de origem. A partir de sua forma ancestral (teosinto), o milho teve sua domesticação iniciada há cerca de 9.000 anos, e impactou positivamente a evolução humana. Do México, o milho se espalhou pelo resto do mundo a partir de 1.500 d.C. – era das grandes navegações.
Pesquisas recentes recontam a história evolutiva do milho e dão conta de sua chegada à América do Sul por volta de 6.500 anos atrás, onde sua domesticação passou por contínua seleção por indígenas amazônicos, com adaptação do cereal aos campos de cultivo local visando seu uso como um importante alimento calórico. Pesquisadores da Embrapa, em parceria mundial, preservam em Bancos de Germoplasma milhares de amostras representativas e estratégicas das raças do cereal. O agronegócio brasileiro continua surpreendendo. A soja foi a primeira lavoura a desenhar uma trajetória de sucesso, seguida na última década pelo milho e não será surpresa se nos anos vindouros o algodão nos surpreender com desempenho semelhante.
Fonte: Canal Rural.